A Embraer pode ter um jato rival para o 737 e o A320?

Fabricante brasileira está diante de um dilema: continuar quase sozinha em seu nicho atual ou partir para a briga com a Boeing e Airbus?
Fictício jato comercial de fuselagem estreita da Embraer
Uma projeção fictícia de um jato comercial maior da Embraer (Arte de Airway sobre imagem de divulgação)

Teria chegado o momento de a Embraer finalmente encarar a Boeing e a Airbus no segmento de jatos comerciais de fuselagem estreita acima de 150 assentos, o mais popular do mundo? Essa pergunta tem sido feita com frequência ao CEO da empresa, Francisco Gomes Neto.

Indo do pioneiro Bandeirante, com seus cerca de 15 a 19 lugares, para o E195-E2, um jato que pode transportar quase 150 passageiros, a Embraer está diante de um dilema: continuar ampliando suas aeronaves comerciais ou permanecer numa faixa de capacidade onde quase não tem rivais?

Por enquanto Gomes Neto nega que a Embraer esteja pensando na primeira hipótese. A empresa afirmou que deverá tomar uma decisão sobre um novo programa de desenvolvimento de aeronaves dentro de dois anos, seja na aviação comercial ou executiva.

Sobre um rival do Airbus A320 e Boeing 737, o CEO da empresa brasileira afirmou à Aviation Week que ela “tem capacidade para fazer algo maior, mas não temos planos de fazer isso agora”. Segundo ele, um aeronave assim envolveria um enorme risco.

Francisco Gomes Neto, CEO da Embraer: jato maior é projeto de enrome risco (GF)

Categoria de maior demanda nas viagens aéreas

A despeito da precaução do executivo-chefe da Embraer, uma nova família de jatos comerciais de maior capacidade é justamente o que o mercado de aviação comercial mais precisará nos próximos anos.

Para chegar a essa conclusão, basta consultar as recheadas carteiras de pedidos da Airbus e Boeing, que não estão dando conta de tamanha demanda. São milhares de aeronaves pendentes de entregas e uma espera longa para recebê-las.

E não há dúvida que a Embraer é atualmente a fabricante de aviões comerciais tecnicamente mais preparada para dar esse salto. Sem a Bombardier e com outros grandes grupos aeroespaciais focados em outros segmentos, caberia à ela a tarefa de atender a demanda excedente de Boeing e Airbus.

Há, contudo, várias barreiras para que a empresa dê esse salto, como veremos a seguir.

Investimento gigantesco

O primeiro desafio é buscar financiamento para um programa ambicioso como esse. A Boeing, enquanto tentava levar à frente do projeto NMA, para um novo jato de média capacidade, imaginava-se um custo na casa das duas dezenas de bilhões de dólares.

Um jato comercial maior da Embraer teria que certamente se basear no tamanho de fuselagem do A320 e do C919

Uma nova família de jatos comerciais de fuselagem estreita não custaria muito menos que isso, mesmo com a equipe de projetos da Embraer, considerada muito eficaz e criativa.

Sozinha, no entanto, a empreitada parece quase impossível , ou seja, a tendência seria buscar fortes parceiros para dividir o investimento, como empresas indianas, por exemplo, que estão ávidas por avançar nesse segmento.

Transição tecnológica

Outro grande problema reside nas metas ambientais estabelecidas globalmente e que pretendem zerar a emissão de carbono nas próximas décadas.

Por conta disso, os atuais jatos comerciais, mesmo com motores mais eficientes, ainda emitirão poluentes, portanto, é preciso escolher uma nova matriz energética.

Conceito de asas super finas da Boeing e NASA
Conceito de asas super finas da Boeing e NASA

A questão é que não há consenso ainda. A Airbus aposta no hidrogênio, o que por si só já configura uma mudança radical em toda infraestrutura de voos e aeroportos.

A Boeing, por sua vez, ainda avalia um novo conceito de aeronave que usaria grandes turbofans de alta razão de derivação e asas super finas. No futuro, ele também poderia se adaptar ao hidrogênio.

Em comum, esses projetos fogem da configuração tradicional vista em um A320 ou no novato chinês C919.

Seria, então, oportuno que uma hipotética aeronave da Embraer se preparasse para esses cenários, porém, há um risco grande de a tecnologia mudar durante o processo de transição.

Tempo de desenvolvimento

A Embraer, por outro lado, poderia partir para um conceito convencional, porém, mais aprimorado, com uso extensivo de materiais compostos em sua construção, aerodinâmica mais refinada e motores capazes de usar 100% SAF, o chamado combustível sustentável de aviação.

Um jato assim certamente teria seis assentos por fileira como o 737 e o A320 em vez dos cinco lugares por fileira do A220, mas poderia ser mais leve que seus rivais, proporcionando maior economia de combustível.

O A321neo é um dos jatos comerciais com maior tempo de espera hoje (Airbus)

O desafio nesse caso é prever quando uma aeronave assim poderia chegar ao mercado. A segunda geração dos E-Jets (E2) levou cinco anos entre o lançamento do programa, em 2013, e a entrada em serviço da primeira versão (E190-E2) em 2018.  Mas era um projeto de aprimoramento sobre uma base conhecida e comprovada e não um avião 100% novo.

Portanto, seriam precisos cerca de sete ou oito anos entre a decisão de levar à frente o projeto e sua estreia em serviço. Se a luz verde ocorresse em 2026, estamos falando em meados da década de 2030.

Ritmo elevado de produção

A categoria de jatos de fuselagem estreita entre 160 e 240 assentos é onipresente em todo o mundo, ao contrário dos aviões regionais. Só isso já é um enorme apelo comercial para fazer parte dela.

Porém, significa que a produção é mais complexa e sobretudo em maior volume. Se hoje a Embraer está com dificuldades para voltar a entregar uma centena de E-Jets por ano, atender a demanda de aviões maiores exigiria investimentos em linhas de montagem mais capazes e talvez múltiplas.

Jato conceitual movido a hidrogênio
Jato conceitual movido a hidrogênio (Airbus)

Trata-se de um mercado que certamente só é viável se a empresa for capaz de entregar 300 ou mais jatos por ano. Como referência, a Boeing entregou 387 aviões 737 MAX em 2023 enquanto a Airbus, 571 aeronaves da família A320neo e mesmo assim eles não foram suficientes.

Para manter uma linha de montagem nesse ritmo também é fundamental contar com uma cadeia de suprimentos ágil e capaz, portanto, com fornecedores confiáveis e preparados. Hoje essa situação segue complicada para todas elas.

Margem de negociação

E não basta ter um ótimo produto tecnicamente dizendo. O C Series, da Bombardier, por exemplo, foi um excepcional projeto de jato comercial, mas quase fez a empresa canadense falir. Só vingou de fato nas mãos da Airbus, que o rebatizou como A220 e até hoje tenta resolver os seus gargalos.

Embraer E195-E2 Tech Eagle
Embraer E195-E2 Tech Eagle (Embraer)

Em virtude disso, um eventual avião comercial maior da Embraer deveria não apenas ser mais eficiente que seus competidores, mas com um custo baixo, capaz de permitir um preço atraente.

Somente assim seria possível enfrentar a força comercial da Boeing e sobretudo da Airbus, empresas que possuem uma ampla família de jatos e que costumam chegar a acordos comerciais difíceis de serem superados.

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Por fim, a Embraer teria que investir em um serviço de suporte ainda mais amplo e ágil que o programa Pool, atualmente em operação. Dessa forma, suas aeronaves ofereceriam uma alta disponibilidade, um dos pontos-chave para companhias aéreas e arrendadores serem convencidos a fechar negócio.

Como se nota mesmo em uma análise superficial, entrar na briga com Airbus e Boeing é um passo arriscado e perigoso, mas ao mesmo tempo tentador. Os próximos anos serão de suma importância para o futuro da Embraer, não há dúvida.

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  1. saudações
    será que os fabricantes de motores teriam capacidade de suprir toda a demanda por novos aviões?

  2. Para essa empreitada pq não o governo brasileiro dar apoio?! Estrategicamente e economicamente falando, isso agregaria trazendo benefícios para o país.

  3. A tecnologia está mudando, e a familia Energia é a resposta, são aeronaves menores, até 50 assentos, e já terá investimentos milionários, bem onde a Embraer já é rei. Ganhando conhecimento, um turboprop de 100 passageiros viria na sequencia. E quem sabe um E3 195 a células de hidrogênio.
    Fora a EVE que merece tb uma família inteira de veículos autônomos. Não há necessidade em se arriscar. Hoje a EVE já vale US $ 1,3bi com um programa enxuto, enquanto a Embraer Comercial, Militar e Executivas juntas valem US $ 3,3bi porém com investimentos astronômicos.

  4. Olá! Acredito que falta somente a decisão da Embraer para o projeto de uma aeronave de até 300 passageiros. Tecnologia e experiência não falta a essa empresa que constroem as melhores aeronaves regionais do mundo. Com o nome e a confiança mundial que possui não será difícil vende-la. Parabéns a Airways pela concepção artística do futuro Embraer E300.

  5. A questão não é a Boing ou a Airbus, e sim a Comc. Onde que alguma coisa brasileira pode pensar em ousar os planos e achar que pode concorrer com o péssimo produto da Mãe China. A diretoria da parte estatal está completamente empenhada em doar a empresa para Pequim.

  6. continuar fabricando somente a linha atual “E2” que basicamente é um projeto com seus 20 anos, também é arriscado.

    A Embraer foi ousada no projeto KC390 e hoje colhe bons frutos.

    Ela pode ser ousada também ao lançar um modelo maior, mesmo que de início, as vendas sejam em quantidade pequena.

    Além do mais, a Embraer tem prestígio internacional e pode muito bem arrancar vendas da Boeing, que hoje enfrenta crise com seu principal modelo “737 max”, que está perdendo confiabilidade.

  7. Boa para todos, ao meu modo de ver seria um sonho que uma empresa brasileira pudesse chegar a construir e fabricar aeronaves de médio e grande porte. porém conforme a matéria disse a Boeing entregando 387 aviões por ano e Airbus 500 570 Isso é muita coisa, para EMBRAER entrar nesse mercado teria que mudar e fazer um investimento muito grande na estrutura da mesma para poder entrarmos em briga de cachorro grande. eu fico imaginando a Boeing passando por todos esses problemas constantemente e também apw com alguns problemas nos propulsores alternativa seria a Embraer trabalhar com os motores rolls-royce. não é fácil e não seria tão simples entrar em briga de cachorro grande pois a Boeing e Airbus Com certeza iria fazer algo para que a Embraer não entrasse nesse mercado. já fico aqui imaginando um avião de médio porte da Embraer que cabe 190 passageiros tranquilamente. e também já fico imaginando como seria a embreagem desenvolver um avião para 350 passageiros Isso me lembra o a330 900. não tenho dúvida que nossa querida Embraer iria desenvolver o melhor e mais eficiente avião do mercado porém os investimentos seriam trilionários e acredito que devemos ainda manter os nossos querido E2 e a cada vez aperfeiçoar mais as eficiências de nossas aeronaves. e quem sabe no futuro próximo a gente com mais investimento e dinheiro em caixa quem sabe pode sair algum projeto bom para dar esse novo passo. vamos Embraer vamos Brasil eu acredito em vocês temos capacidade para fazer qualquer coisa até nave espacial. Abraços a todos 👍🏾☺️

  8. Eu ousaria. procuraria um fundo soberano dos países como Arábia Saudita, Emirados Árabes, Catar, sei lá. Montaria esse projeto e até quem sabe, eles poderiam entrar como sócios.
    Mercado tem.

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