Exocet, o míssil que virou referência pop nos anos 80

Devastador míssil anti-navio francês ganhou notoriedade na Guerra das Malvinas ao destruir navios britânicos, e no Brasil, inspirou a criação das “calcinhas bélicas” do hit Katia Flávia
Dassault Super Étendard da Armada Argentina leva um míssil Exocet sob asa (foto - Armada Argentina)
Dassault Super Étendard da Armada Argentina leva um míssil Exocet sob asa (Armada Argentina)

“Alô, polícia! Eu tô usando um Exocet calcinha!”. Gerações dos anos 1980 e 1990 cantaram o hit “Katia Flávia, Godiva do Irajá” sem entender ao certo do que se tratava o tal Exocet. De fato, a música de Fausto Fawcett lançada em 1987 e depois reproduzida com maior sucesso por Fernanda Abreu, exige algum conhecimento bélico para que o poder da roupa íntima da “loiraça belzebu” seja compreendido.

“Exocet” (“peixe-voador”, em francês) é o nome do devastador míssil francês antinavio AM.39 que ganhou notoriedade durante a Guerra das Malvinas/Falkland, há 40 anos. Na ocasião, o artefato foi usado pelos argentinos para afundar de forma fulminante dois navios de combate britânicos, deixando um terceiro seriamente danificado, com cerca de 40 vítimas entre os tripulantes ingleses nos três ataques.

O afundamento do destroier inglês HMS Sheffield foi a estreia em combate do míssil Exocet, o que despertou ampla cobertura da mídia internacional e especialmente do Brasil, pela proximidade geográfica com o conflito. Do dia para noite surgiram centenas de pedidos a MBDA Systems, fabricante do armamento que acabara de se provar eficiente.

Mais do que altamente destrutivo e capaz de penetrar nos sistemas de defesas de uma força militar considerada moderna, o Exocet também era acessível. Em 1982, cada míssil custava US$ 200 mil e podia destruir um navio de combate de centenas de milhões de dólares. Iraque, Líbia, Israel, Paquistão, Arábia Saudita e dezenas de outros países adquiriram o AM.39 após o conflito, apesar da derrota da Argentina. Até o Brasil comprou.

Ataque ao HMS Sheffield

Os ingleses sabiam que a Argentina possuía os novíssimos mísseis Exocet, mas achavam que os argentinos não saberiam tirar proveito deles. Quando a Armada Argentina (marinha) comprou os artefatos, a França não transferiu ao país hermano o software necessário para sua aplicação em aeronaves. Desta forma, os navios da Royal Navy, da Marinha Real Britânica, pensaram que poderiam navegar sem temer por este perigo. Mas não foi uma boa ideia subestimar os inimigos.

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Foto tirada a partir de um helicóptero da Royal Navy momentos após o HMS Sheffield ser alvejado pelo Exocet argentino (acervo Royal Navy)
Foto tirada a partir de um helicóptero da Royal Navy momentos após o HMS Sheffield ser alvejado pelo Exocet argentino (acervo Royal Navy)

Para surpresa dos ingleses e também do fabricante do Exocet, os argentinos conseguiram criar um programa que permitia disparar os mísseis com exatidão. Na manhã do dia 4 de maio, um avião de patrulha marítima P-2 Neptune, voando próximo às ilhas Malvinas, detectou uma formação de grandes navios na marinha britânica. Estava lançada a missão.

O P-2 comunicou a posição das embarcações e imediatamente dois caças Dassault Super Étendard armados com o míssil Exocet, partiram da base da Armada em Rio Grande, a 2.800 km de Buenos Aires. Os “caçadores de navios” foram acompanhados por dois caças IAI Dagger e dois Douglas A-4 Skyhawk para proteção, um Learjet de observação, e um KC-130 Hércules, que abasteceu os aviões de ataque na viagem de ida.

Os Super Étendard voaram em direção à frota inglesa em altitude muito baixa para evitar a detecção pelos radares dos navios. Em curtos intervalos os caças elevavam a altitude para rápidas varreduras de radar a fim de vigiar os barcos britânicos.

Os navios da marinha britânica foram encontrados por um Loockheed P-2 Neptune de patrulha marítima (acervo Armada Argentina)
Os navios da marinha britânica foram encontrados por um Loockheed P-2 Neptune de patrulha marítima (acervo Armada Argentina)

Quando os radares do caças argentinos encontraram os navios ingleses, a cerca de 70 km de distância, os pilotos conseguiram “travar” os alvos e os Exocet foram lançados a 50 km das embarcações. O primeiro míssil atingiu em cheio o centro do destróier HMS Sheffield, abrindo um enorme buraco na linha d’água do casco, vitimando imediatamente 40 marinheiros ingleses com a explosão.

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O segundo Exocet explodiu próximo a fragata Yarmouth, de acordo com registro da marinha inglesa. Os argentinos, no entanto, afirmam com convicção ter atingido o porta-aviões HMS Hermes com esse ataque. O Super Étendard argentino que realizou esse ataque, em operação até hoje, possui uma marca de guerra que mostra a embarcação britânica parcialmente afundada. Já o outro caça leva a marca de uma vitória contra um navio.

Durante o ataque, os navios britânicos em nenhum momento detectaram os aviões se aproximando, tampouco o míssil. Logo após a explosão do primeiro Exocet, devido ao local atingido na embarcação, os britânicos julgaram terem sido atacados por um submarino da Armada, que era a sua principal preocupação. Curiosamente os submersíveis argentinos estavam em condições lamentáveis de operação.

Um navio cargueiro da Marinha inglesa também foi atingido por um míssil durante a Guerra das Malvinas
Um navio cargueiro da Marinha inglesa também foi atingido por um míssil durante a Guerra das Malvinas

A então embargada Argentina, no entanto, entrou na guerra com apenas seis mísseis no arsenal e durante o conflito não recebeu o restante da encomenda da França, que compreendia 40 Exocets. Por conta disso, os Super Étendard efetuaram apenas mais duas missões na Guerra das Malvinas, tendo confirmado a destruição de mais duas embarcações inglesas. Os outros mísseis erraram os alvos.

Outras vítimas do Exocet

O Iraque foi um dos países que mais comprou mísseis Exocet. Na década 1980 quando entrou em guerra com o Irã, o país então governado por Saddam Hussein atingiu 135 navios iranianos durante o conflito, entre 1980 e 1988. Os mísseis eram lançados por caças Dassault Mirage F-1, alugados da França.

Em meio ao conflito entre as duas nações do Oriente Médio, a fragata USS Stark da Marinha dos Estados Unidos navegando no Golfo Pérsico foi atingida por dois Exocets lançados de um avião iraquiano, matando 37 tripulantes norte-americanos. A embarcação dos EUA viajava no limite da faixa de exclusão imposta pelo Iraque.

O ataque ao USS Stark matou 37 marinheiros norte-americanos
O ataque ao USS Stark matou 37 marinheiros norte-americanos

Em 1990, na Guerra do Golfo, uma lancha de combate da marinha do Kuwait afundou um navio iraquiano com a versão naval do Exocet, o SM.39.

Anatomia do Exocet

O desenvolvimento do míssil Exocet foi iniciado em 1967 pela MBDA Systems atendendo a um pedido das forças armadas francesas, que queriam um artefato pequeno capaz de por a pique um navio, até então algo inédito. O armamento foi declarado operacional em 1973 e logo foi incorporado ao arsenal francês.

O míssil nasceu primeiro nas versões AM.39, para utilização em aviões, e o SM.39, que pode ser disparado a partir de embarcações, mesmo pequenas. Ao longo de seus 4,7 metros de comprimento e 855 kg, o Exocet esconde em seu interior um motor turbojato, um radar e uma carga explosiva de até 165 kg.

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O míssil Exocet carrega até 165 kg de explosivo. Cada unidade custa cerca de US$ 1 milhão
O míssil Exocet carrega até 165 kg de explosivo. Cada unidade da MM.40, a mais moderna, custa cerca de US$ 1 milhão

Com um alcance de 70 km a velocidade máxima de 1.100 km/h, o míssil tem orientação inercial e radar ativo na fase final. Ou seja, o Exocet precisa da orientação do radar da aeronave que o lançou na fase inicial, e nos últimos quilômetros o seu computador de bordo termina o trajeto automaticamente, até explodir sobre o alvo ou próximo a ele.

Com o passar do tempo o Exocet evoluiu e ganhou versões que podem ser lançadas a partir de helicópteros e também de submarinos. O míssil da MBDA é usado atualmente nas forças armadas de 31 países.

Exocet no Brasil

A Marinha do Brasil adquiriu seus primeiros mísseis Exocet no final da década de 1970. Os primeiros a chegarem foram a versão SM.39, para serem disparadas a partir de navios. As versões aéreas AM.39 foram compradas somente nos anos 1980 e aplicadas em helicópteros. As duas versões do míssil usados no Brasil nunca foram utilizadas em combate, sendo disparadas apenas em ações de treinamento.

O Brasil, aliás, domina parte da tecnologia para construir o Exocet. Em 2014 a Avibras iniciou o desenvolvimento dos mísseis SM.39 e AM.39 em suas versões mais avançadas. Os primeiros testes em campo aberto com os artefatos fabricados no Brasil estão programados para 2016.

Veja mais: Marinha do Brasil se interessa pelo míssil mais rápido do mundo

O Brasil tem mais experiência com o SM.39, a versão do Exocet lançada a partir de embarcações (Foto - MBDA)
O Brasil tem mais experiência com o SM.39, a versão do Exocet lançada a partir de embarcações (Foto – MBDA)

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  1. O Brasil apenas “domina” a construção do motor do Exocet, algo que só foi possível com a participação da MBDA (Atual fabricante do míssil). A matéria não menciona a aquisição por parte da MB do Exocet lançado por submarino que equiparão os Scorpene.

  2. JÁ HA MUITO QUE ESTE PAIZ TEM A INDOLE DE SUBMISSÃO PERANTE O MUNDO ..UMA ARGENTINAZINHA AKI NOSSA VIZIN TEM MUITO MAI KNOWHOW BELICO QUE NÓS OU SEJA UMPRESIDENTE CACHACEIRO UMA ANTA E UM EX BABACA TORNARAM ESTE PAIZ NUM PAIZ DE BABACAS

  3. Calcinha Exocet, um cintaralho da ex-miss FEBEM casada com um figurão contravenção. Mandou bem no artigo. O nerdcast 303 fala da guerra das malvinas. Você deveria ouví-lo.

  4. Thiago, o Brasil já tem sua “versão” do Exocet. Existe a modernizaçaõ dos modelos comprados ( dash38, dash39) e o Mansup, que é a versão brazuca do classico da década de 80/90. E a critica é que todos os modernos misseis tem hoje um turbofan para fazer o voo, enquanto que o “novo” missil usa foguetes, reduzindo seu raio de ação para menos de 100 km, Se serve de consolo, há um missil cruise em desenvolvimento, que poderia sem muita dor de cabeça, receber o buscador de radar do Mansup, e com um pouco de engenharia, seria uma opção viável na faixa dos 250 km.

    Agora para a zoeira: só tem medo de calcinha exocet quem não usa cueca CIWS.

  5. Eliseu Teixeira desconhece a realidade atual das Forças Armadas da Argentina, principalmente da Força Aérea que quase não voa mais.

  6. Com os sistemas antimísseis e a verdadeira barragem de fogo que equipam hoje os navios e porta aviões mais modernos das marinhas dos EUA, Rússia e China, dificilmente um mísse desse tipo chegaria a atingir o alvo.

  7. Djalma

    Um único míssil dificilmente atingiria uma embarcação em uma força tarefa dos países que você citou. Uma embarcação isolada talvez. O sistema de defesa antiaérea que equipa as grandes embarcações americanas, o famoso sistema Aegys(na realidade ele é muito mais que um sistema antiaéreo, ele também lida com ameaças de superfície e submarinas), foi criada para lidar com o lançamento múltiplo de mísseis contra a força tarefa, um ataque descrito como saturação das defesas do inimigo, em resumo, são tantos mísseis a caminho que o sistema não consegue lidar com todos eles e eventualmente um ou outro míssil passa e acerta uma embarcação.

  8. Como de praxe no brasil, tudo acaba em bunda, calcinha e futebol… até mesmo se tratando de armamento bélico!
    Muito boa matéria.

    Parabéns!

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