Boeing orienta companhias sobre como acalmar passageiros desconfiados com o 737 MAX
Fabricante está estudando formas para ajudar operadores do MAX a reconquistar a confiança do público


Desde que os jatos 737 MAX da Boeing foram aterrados em março, depois de dois acidentes que mataram 346 pessoas, a fabricante vem repetidas vezes refazendo a seguinte pergunta: os passageiros vão ficar com medo de voar no avião quando ele voltar ao serviço?
Enquanto trabalha em reparos técnicos na aeronave, necessários para a aprovação regulatória, a Boeing também vem realizando pesquisas com milhares de passageiros no mundo todo para tentar descobrir a resposta. Os últimos resultados, divulgados pela empresa neste mês, apontaram que 40% dos passageiros regulares disseram que não estariam dispostos a voar no MAX.
Temendo a rejeição do público, a fabricante norte-americana está criando estratégias para ajudar as companhias aéreas a reconquistar a confiança dos passageiros e convencer os viajantes de que o avião mais popular da empresa é seguro. A informação é do jornal The New York Times, que teve acesso ao material que a Boeing divulgou aos operadores da aeronave.
O material tem uma série de orientações para as companhias em diferentes situações. Por exemplo, se um passageiro desistir de voar no MAX depois que comprar a passagem e estiver prestes a embarcar, a Boeing diz que a empresa aérea poderia oferecer uma nova reserva. Outra tática citada pela fabricante é preparar comissários de bordo e pilotos para conversar com os passageiros sobre a aeronave e distribuir cartões de informação detalhando por que o MAX é seguro.

“Toda interação com um passageiro ansioso, seja pessoalmente ou on-line, é uma oportunidade de demonstrar nosso cuidado e preocupação”, diz um dos pontos da apresentação da Boeing. “Isso é tão simples quanto o reconhecimento do estado de espírito de um passageiro. A pesquisa mostra que as emoções conduzem a tomada de decisões, portando, uma conexão humana será mais eficaz do que apelos racionais.”
Nos casos mais extremos, a Boeing sugere o uso de “técnicas relacionas a emergências médicas em voo” para diminuir uma possível situação de risco a bordo.
Os documentos destacam os enormes desafios que a Boeing vai enfrentar nos próximos meses, enquanto tenta restaurar sua reputação. O MAX permanece proibido de voar e não há um uma previsão garantida sobre o seu retorno. Em apenas uma semana e meia, a fabricante demitiu seu CEO e anunciou a suspensão temporária na produção do 737 MAX.
Segundo a reportagem do jornal americano, a Boeing consultou milhares de viajantes no mundo todo quatro vezes desde maio e concluiu que nesse tempo o ceticismo em torno do MAX não mudou muito. Entre os passageiros dos EUA, apenas 52% disseram que estariam dispostos a voar no avião, de acordo com a pesquisa.
“A conscientização geral sobre os problemas em torno do 737 MAX permanece muito alta em todos os países”, escreveu a Boeing.
A Boeing divulgou o “manual” de estratégias para o retorno do MAX aos operadores por meio de teleconferências. O esforço foi liderado por Bernard Choi, membro da equipe de comunicação da Boeing.

Alguns executivos de companhias aéreas dos EUA ficaram irritados com a apresentação e o material da Boeing, apontando que a fabricante perdeu a credibilidade, de acordo com a publicação. Em outra ponta, dezenas de companhias de outros país, especialmente as menores, podem achar os materiais úteis.
“Nos envolvemos rotineiramente com as equipes de comunicação de nossos clientes de companhias aéreas para obter feedback e informá-los sobre nossos planos mais recentes”, disse Gordon Johndroe, porta-voz da Boeing, em comunicado divulgado na segunda-feira. “Cada companhia aérea é diferente em suas necessidades, por isso fornecemos uma ampla gama de documentos e assistência que eles podem optar por usar ou adaptar conforme entenderem.”
Durante as teleconferências, a empresa também distribuiu um conjunto de infográficos, cartões de referência, vídeos e perguntas frequentes.
Um dos vídeos foi uma explicação animada do novo software de voo do MAX, o MCAS. Na apresentação, um narrador explica que, nos acidentes, o programa foi ativado repetidamente depois que um sensor na fuselagem do avião não funcionou corretamente, causando a queda. O vídeo continua explicando as mudanças que a Boeing está fazendo no sistema. O conteúdo, porém, vem com uma marca d’água informando se tratar de um “rascunho – cópia avançada, certificação pendente”.
“A vida depende do trabalho que fazemos”, diz Jim Webb, piloto comercial da Boeing, em outro vídeo. “Sabemos que, quando você entra a bordo, deposita sua confiança em nós”, continua, segundo o jornal.

Em alguns pontos o material da Boeing é surpreendentemente autocrítico. O documento sugere as companhias aéreas que digam: “A Boeing entende que ficou aquém e nos decepcionou, assim como o público voador, e se comprometeu coma melhoria contínua e aprender.”
Em outro texto, a Boeing diz que as companhias aéreas podem contar aos seus pilotos o seguinte: “Dissemos aos nossos parceiros da Boeing que eles não se comunicavam o suficiente sobre o MCAS, e eles nos ouviram. No futuro, eles estão comprometidos em fazer um trabalho melhor se comunicando conosco.”
A Boeing não informou totalmente aos pilotos sobre como o MCAS funcionava até depois do primeiro acidente, na costa da Indonésia, em outubro de 2018.
Os materiais também mostram que a Boeing tentaria adiar a narrativa de que o MAX foi desenvolvido sob intensa pressão de prazo, enquanto a empresa enfrentava uma concorrência acirrada de seu rival europeu, o Airbus A320neo.
Um documento contendo o rascunho de perguntas frequentes, destinado a ajudar as companhias aéreas a orientarem seus funcionários, a Boeing incluiu a pergunta: “É verdade que o 737 MAX foi introduzido às pressas no serviço comercial?”
A Boeing aconselha que as companhias aéreas respondam da seguinte maneira: “Durante um período de seis anos, a Boeing trabalhou em um processo disciplinado de desenvolvimento metódico que culminou com um programa de testes robusto que validava a segurança e o desempenho da aeronave.”

Em uma seção da apresentação focada em mídia social e marketing, a empresa disse que planejava “ampliar qualquer história positiva” sobre o MAX e que pretendia comprar espaços publicitários para promover o retorno o avião. A fabricante também vai atualizar o website dedicado às atualizações da aeronaves, com “usabilidade aprimorada” para incentivar o público a saber mais sobre o avião e retornar a página repetidas vezes.
A apresentação dizia que a “equipe digital e de mídia” da Boeing está “monitorando as conversas sociais (sobre o 737 MAX) o tempo todo”.
A fabricante também indicou aos operadores que estava preparando respostas para o caso de algum MAX ter dificuldade mesmo após voltar ao serviço, o que poderia acontecer, pois mais de 500 jatos já foram construídos e mais de 5.000 unidades estão encomendadas. Os cenários que a Boeing antecipou podem incluir falhas no motor e fumaça na cabine.

Na apresentação, a Boeing prometeu trabalhar com as companhias aéreas durante os primeiros voos no retorno do 737 MAX para aumentar a confiança do consumidor, incluindo a participação de executivos da empresa a bordo.
“Sabemos que temos trabalho a fazer para restaurar a confiança na Boeing e no MAX”, disse Johndroe na segunda-feira. “Estamos trabalhando em estreita colaboração com as companhias aéreas, seus pilotos e comissários de bordo para garantir que eles tenham as informações necessárias para fornecer ao público que viaja para garantir que, assim que o processo de certificação estiver concluído, o MAX será um dos aviões mais seguros que voam atualmente.”
E você, vai voar no 737 MAX quando ele voltar ao serviço?
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