E se o Brasil não tivesse comprado os caças Gripen?

Outros finalistas do programa FX-2 eram o Boeing F/A-18 Super Hornet e o Dassault Rafale, mas eles não ofereciam transferência de tecnologia e a opção de serem produzidos no Brasil

O primeiro caça Saab Gripen E destinado à Força Aérea Brasileira (FAB) chegará ao Brasil em setembro. Embora ainda não seja um modelo totalmente operacional, o desembarque do novo jato de combate no país será o início da materialização de um projeto que se arrasta há quase 30 anos.

Desde o início da década de 90 que a FAB estava consciente de que a vida útil dos caças Mirage III e F-5 se aproximava do fim. Assim foram iniciados os planos para substituí-los, dando origem ao Programa FX-BR, lançado em 1991.

No início do programa foram propostas quatro possibilidades: projetar e fabricar no Brasil um novo caça, a participação de um programa já em andamento, a produção local de um avião estrangeiro e a compra direta, que na época foi a opção selecionada.

Os fabricantes que responderam ao pedido oficial da FAB foram a McDonnell Douglas (hoje Boeing) com o F/A-18C/D e a MAPO-MiG, com o MiG-29. Também foram recebidos informalmente dados sobre o Lockheed Martin F-16A/B e o Dassault Mirage 2000.

No entanto, o tempo foi passando e nenhuma opção foi definida pela FAB e o governo brasileiro. Como solução temporária, optou-se pela modernização dos F-5 e uma compra “tapa-buraco” de 12 caças de superioridade aérea Mirage 2000B/C de segunda mão, adquiridos de estoques da França – e que foram operados pela FAB entre 2005 e 2013.

O Mirage 2000 voaram com a FAB entre 2005 e 2013 (FAB)
O Mirage 2000 foi uma solução provisória enquanto o programa FX não era definido (FAB)

Programa FX-2

Na virada do século e após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o plano de aquisição de novos caças da FAB foi completamente remodelado. Em 2006, foi criado o programa FX-2, desta vez exigindo transferência completa de tecnologia e, mais adiante, o requisito de direito de produção sob licença da aeronave no Brasil e de exportação para o mercado sul-americano.

Os aviões finalistas do programa FX-2 eram os bimotores Dassault Rafale e Boeing F/A-18E/F Super Hornet e o monomotor Saab JAS 39 Gripen E. O caça russo Sukhoi Su-35 também foi oferecido ao Brasil, mas acabou excluído da fase final de seleção.

Após mais de 10 anos de discussão, no dia 18 de dezembro de 2013 foi anunciado que o governo brasileiro, sob a administração de Dilma Rousseff, optou pela aquisição do Saab JAS 39 Gripen E, que na época estava na fase inicial de desenvolvimento.

O Gripen E é um caça avançado que cabe no bolso do Brasil (SAAB)

Diferentemente do outros finalistas, a oferta da fabricante sueca era a única que cumpria todos os requisitos pedidos pela FAB, sobretudo a transferência irrestrita de tecnologia e direitos de produção integral da aeronave no Brasil. Outra vantagem do Gripen é seu custo operacional relativamente baixo, estimado em cerca de US$ 4.500 por hora de voo.

Embora muito criticado por ainda ser um projeto incipiente, a escolha do caça sueco foi sem dúvida a melhor opção para o Brasil, que nos próximos anos será a única nação de toda América Latina com uma indústria capacitada para produzir e exportar aeronaves de combate supersônicas. Mas o que poderia ter acontecido se a FAB tivesse escolhido outra opção de caça?

Boeing F/A-18 Super Hornet

Considerado o melhor caça entre os finalistas do programa FX-2, o F/A-18 Super Hornet fabricado pela Boeing é uma aeronave testada em combate e que pode ser equipada com alguns dos sensores e sistemas de armas mais avançado do mundo. No entanto, a proposta sugerida pelos norte-americanos limitava a transferência de tecnologia da aeronave ao Brasil e não considerava em hipótese alguma a liberação para produzir os aviões no Brasil.

Boeing F/A-18E-F Super Hornet
A proposta da Boeing com o Super Hornet não agradou os estrategistas brasileiro (US Navy)

A oferta da Boeing incluía a possibilidade de transferência de tecnologias necessárias (mas não irrestritas) para a realização de serviços de manutenção dos caças no Brasil. Os americanos também ofereceram apoio em pesquisas no campo de aerodinâmica supersônica e planejavam fornecer um túnel de vento tri-sônico, equipamento que em tese poderia ajudar engenheiros brasileiros a projetar um caça supersônico no futuro.

Além de não satisfazer os requisitos da FAB, também pesou o fato do elevado custo operacional do Super Hornet. Embora tenha um preço de aquisição inferior ao do Gripen E (US$ 70 milhões contra US$ 100 milhões), o valor da hora de voo do F/A-18 é exorbitante para os padrões brasileiros: em torno de US$ 22.000.

Dassault Rafale

Ao contrário da oferta dos EUA, a proposta da França era mais cordial. A Dassault ofereceu transferência de tecnologia e a implantação de uma linha de montagem do Rafale no Brasil em parceria com a Embraer e outras 10 empresas brasileiras.

Assim que o acordo fosse fechado, os franceses prometeram que os primeiros aviões seriam entregues em três anos e a tecnologia para construir os caças seria transferida para indústria nacional em 10 anos, incluindo detalhes para construir os motores e os aviônicos das aeronaves no Brasil – os dois únicos pontos que não foram cobertos pela proposta vencedora da Suécia. Evoluindo para esse ponto, a proposta da Dassault passaria de transferência de tecnologia para um cessão de segredos industriais.

O Rafale está em operação na França e no Egito; Qatar e agora a Índia estão da fila de espera (Divulgação)
O Rafale é operado na França, Egito e Índia; Qatar será o próximo cliente (Divulgação)

Em 8 de setembro de 2009, o então presidente Lula anunciou a compra de 36 caças Rafale por US$ 4 bilhões, além de acordos adicionais para aquisição e transferência de tecnologia de helicópteros e submarinos. Em troca, os franceses ainda comprariam 10 jatos multimissão C-390 Millennium, que nessa época começava a ser desenvolvido pela Embraer. No entanto, a decisão presidencial contrariava o relatório do Comando da Aeronáutica, que preferia o Gripen E e o acordo não foi adiante.

Considerando os termos técnicos, a proposta da França era ótima. Após um longo período de maturação, o caça da Dassault hoje está na lista do mais avançados do mundo. Porém, se o Super Hornet com seu elevado custo operacional assustava as finanças da FAB, o Rafale tinha potencial para implodir o caixa da Aeronáutica, ameaçando o aterramento da frota ou limitar seu uso. A hora de voo do jato francês é estimada em US$ 45.000, inconcebível para a realidade brasileira.

Sukhoi Su-35

A exclusão do caça russo Su-35 entre os finalistas do programa FX-2, definidos em 2008, foi uma questão mais política do que técnica. Nessa época, os EUA haviam vetado a venda de aviões Super Tucano da Embraer à Venezuela, pois a aeronave continha componentes americanos. Este episódio desagradou alguns estrategistas brasileiros pois resultou na aproximação da Venezuela com a Rússia, que vendeu uma aeronave muito superior ao governo venezuelano, o Su-30.

Com desempenho formidável, o Su-35 é um dos caças mais avançados e temidos do mundo (UAC)

Extremamente manobrável, veloz e com armamentos de ponta, o caça da Sukhoi era considerado o favorito do programa de renovação da FAB desde a primeira edição do programa FX nos anos 1990, mas que por pressão dos EUA ficou fora nas duas listas finais. As propostas dos russos também incluía transferência de tecnologia (mas não irrestrita) e licença para produzir o avião no Brasil.

Como parte do acordo, a Rússia ainda convidou a Embraer a participar do desenvolvimento de um caça stealth de quinta geração, hoje materializado na forma do Sukhoi Su-57.

Era uma proposta formidável, mas repleta de poréns. Tradicionalmente alinhado com os EUA (e hoje mais do que nunca), o Brasil teria enormes dores de cabeça com diplomatas americanos ao negociar um acordo tão importante com os russos.

Su-57: imagina um desses com as insígnias da Força Aérea Brasileira? (Dmitry Zherdin)

A escolha do Su-35 representaria uma mudança completa na doutrina operacional da aviação de caça da FAB, treinada com equipamentos americanos, fora a incompatibilidade do jato russo com outros sistemas de defesa nacionais, que teriam de ser reformulados. E não podemos esquecer de seu custo por hora de voo, o número mágico para manter o avião em serviço: US$ 65.000.

Veja mais: Há 25 anos voava o primeiro jato comercial da Embraer

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  1. No meu humilde ponto de vista, analisando todos os fatos, vejo que essa foi a melhor escolha (Gripe NG) pelo governo brasileiro. Embora, algumas aeronaves sejam muito avançada, o Gripen não deixa a desejar perto das outras aeronaves.

  2. Tenho orgulho de ssber que o meu pais brasil está fazendo uma ótima ação humanitária para ajudar os nossos irmãos ds Líbia

  3. Do ponto de vista técnico-operacional, não tenho dúvidas que o Grippen-E foi a melhor aquisição. Além do custo baixíssimo por hora voada, o Grippen foi projetado para fazer operações em tramos de rodovias. Nota 9,5!

  4. Diga O que quiserem, mas foi no governo do PT que a Aeronáutica deu esse enorme passo para atualização dos seus aviões. Seguramente em 10 anos a Embraer estará apta a fazer esses aviões e ajudar na pauta de exportações.

  5. Não entendo os militares serem contrários ao governo do PT, durante este governo tiveram vários projetos como submarinos aviões entre outros

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